Acesse a íntegra do estudo aqui. Com população de 224,8 mil pessoas e 328 assassinatos, a cidade de Maracanaú, na região metropolitana de Fortaleza, teve a maior taxa de homicídios por 100 mil habitantes do País em 2017: 145,7. Os dados foram revelados pelo Atlas da Violência 2019, cuja seção “Retratos dos municípios brasileiros” foi divulgada nesta segunda-feira, 5, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, autores do estudo.
Os números foram obtidos a partir dos registros do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde. Além disso, os pesquisadores estimaram quantas mortes com causa desconhecida eram, na verdade, homicídios. Assim, a quantidade de crimes dessa natureza que aconteceram no País chegaria a quase 73 mil, 11% a mais dos que os 65 mil registrados originalmente e que já representava um recorde.
O levantamento mostrou que 18 das 20 mais violentas estão nas regiões Norte ou Nordeste; a Bahia aparece com cinco cidades no ranking, seguida pelo Pará, com quatro. A cidade de Altamira, onde na semana passada um massacre deixou 58 mortos em um presídio, foi considerada a segunda mais violenta naquele ano; em 2015, ela já havia figurado como a primeira mais violenta. O Estado esteve na cidade na semana passada e conversou com moradores sobre o cenário de violência.
Veja a lista das 20 cidades mais violentas:
UF | CIDADE | POP | Taxa p/100 mil hab |
CE | Maracanaú | 224.804 | 145,7 |
PA | Altamira | 111.435 | 133,7 |
RN | São Gonçalo do Amarante | 101.492 | 131,2 |
BA | Simões Filho | 136.050 | 119,9 |
RJ | Queimados | 145.386 | 115,6 |
RS | Alvorada | 208.177 | 112,6 |
BA | Porto Seguro | 149.324 | 101,6 |
PA | Marituba | 127.858 | 100,1 |
BA | Lauro de Freitas | 197.636 | 99 |
BA | Camaçari | 296.893 | 98,1 |
CE | Caucaia | 362.223 | 96,6 |
SE | N. Senhora do Socorro | 181.928 | 96,3 |
PE | Cabo de Santo Agostinho | 204.653 | 94 |
PA | Marabá | 271.594 | 89 |
PA | Ananindeua | 516.057 | 88,1 |
CE | Fortaleza | 2.2627.48 | 87,9 |
RN | Mossoró | 295.619 | 86,4 |
PE | Vit. de Santo Agostinho | 137.578 | 85,5 |
AC | Rio Branco | 383.443 | 85,3 |
BA | Eunápolis | 115.290 | |
O estudo levou em consideração os dados de 310 municípios onde a população é maior que 100 mil habitantes - a elaboração de taxas onde a população é muito pequena poderia levar a distorções. A menor taxa é a de Jaú (2,7), no interior de São Paulo.
O Atlas mostra que a alta nacional é puxada por um grupo de cidades. “Enquanto 59 municípios possuíam índices acima de sessenta mortes por 100 mil habitantes, em apenas oito deles as taxas superaram a marca de cem”, escreveram os pesquisadores.
A pesquisa voltou a constatar o que os especialistas já chamam atenção há alguns anos: a concentração das mortes em poucas cidades. Metade dos assassinatos se concentram em 2,1% dos municípios, 120 cidades. A análise mostra que estudos anteriores já verificaram que, aproximando a lupa ainda mais, é possível notar que metade dos homicídios nos municípios mais violentos acontecem em, no máximo, 10% dos bairros.
Veja lista das 20 cidades mais pacíficas:
Ranking | Cidade | População | Taxa homicídio (p/cem mil hab) |
1º | Brusque | 125.81 | 4,8 |
2º | Atibaia | 138.449 | 5,1 |
3º | Jaraguá do Sul | 167.3 | 5,4 |
4º | Tatuí | 117.823 | 5,9 |
5º | Varginha | 133.384 | 6,7 |
6º | Jaú | 144.828 | 6,9 |
7º | Lavras | 101.208 | 6,9 |
8º | Botucatu | 141.032 | 7,1 |
9º | Indaiatuba | 235.367 | 7,2 |
10º | Limeira | 298.701 | 7,4 |
11º | Valinhos | 122.163 | 7,4 |
12º | Catanduva | 120.092 | 7,5 |
13º | Santana de Parnaíba | 129.261 | 7,7 |
14º | Sertãozinho | 121.412 | 8,2 |
O documento ressalta que, nas últimas duas décadas, os municípios menores tiveram crescimento acentuado das taxas de homicídio, “ao passo que os maiores lograram redução nos índices de homicídio, fazendo com que esses grupos ficassem mais parecidos”. “Enquanto houve crescimento de 113% na taxa dos municípios pequenos entre 1997 e 2017, os médios sofreram relativamente pouco aumento na taxa de letalidade, e os grandes lograram uma redução de 4,5%.”
Os pesquisadores mostram que o crescimento das mortes se insere em um contexto de acirramento da guerra contra o narcotráfico pelo domínio das rotas internacionais e pelo controle dos mercados varejistas. O Estado mostrou neste fim de semana que no Norte, onde se concentram os massacres em cadeias, ao menos 17 facções disputam os territórios pelos quais passam drogas.
Indicadores socioeconômicos ajudam a entender cenário de violência
O Atlas compara indicadores socioeconômicos com a taxa de homicídios das cidades para mostrar que as localidades mais violentas com frequência também são as mais precárias em prestação de serviços públicos. “Nessas duas regiões (Norte e Nordeste), salta aos olhos os maiores índices de jovens entre 15 e 24 anos que não estudam, não trabalham e são vulneráveis à pobreza: esses são exatamente os indivíduos principais a serem focalizados em qualquer programa de enfrentamento à criminalidade.”
“As diferenças eram nítidas ainda em relação aos indicadores de condições habitacionais, sempre piores nos municípios mais violentos. Por fim, a média do percentual de jovens entre 15 e 24 anos que não estudavam, não trabalhavam e eram vulneráveis à pobreza era quatro vezes maior no conjunto dos mais violentos.”
O estudo aponta que, antes da violência e da morte prematura de jovens nos territórios mais violentos, já houve inúmeras “mortes simbólicas, uma vez que uma parcela da sociedade residente nesses locais não teve acesso a condições de desenvolvimento infantil, a oportunidades educacionais e ao mercado de trabalho na juventude, nem a bens culturais e materiais, parte do ideal de sucesso nas modernas economias de mercado”.
Contra o aumento da insegurança, o Atlas aponta que as ações “devem passar, necessariamente, pelo uso mais inteligente e qualificado do sistema coercitivo para retirar de circulação e levar ao sistema de justiça criminal homicidas contumazes, líderes de facções criminosas, milicianos e criminosos que representam maior risco à sociedade”. “Por fim, é urgente repensar a política criminal, bem como o saneamento do sistema de execução penal, sem isso o Estado não conseguirá ter o controle das prisões, fonte dinamizadora das facções.