A greve de docentes nas universidades e institutos federais pelo Brasil encerrou sua terceira semana chamando a atenção para os problemas vividos na educação, como orçamento precário, falta de estrutura e baixos salários. O ANDES-SN, entidade que representa a maioria dos docentes das universidades, contabiliza 47 instituições paralisadas, enquanto os Institutos Federais, segundo o SINASEFE, somam 78. Se acrescentarmos os servidores da base da FASUBRA, que representa os técnico-administrativos das universidades, são milhares de trabalhadores com atividades suspensas em todo país.
Atento ao movimento nas Instituições Federais de Ensino (IFES), o presidente Lula voltou a insistir que os trabalhadores têm o direito de se manifestar. Dizendo ser “o filho, pai, irmão [e] tio das greves”, Lula afirmou a disposição do governo em negociar: “A mim, não encanta ver parte da educação em greve. Eu tenho que inaugurar muitas escolas técnicas, visitar universidades, e eu quero que os professores e os funcionários estejam tranquilos”.
A fala de Lula não deixa de ser alentadora, apesar da ausência, até o momento, de proposta capaz de resolver o impasse. Mas se Lula não parece irritado com os docentes e servidores das IFES, quem está se estrebuchando com a greve é uma parte da imprensa. Em editorial publicado no último domingo no jornal “O Globo”, intitulado “Greve oportunista corrói o prestígio das universidades federais”, a empresa da família Marinho tripudia para cima dos trabalhadores das universidades e institutos federais, elencando argumentos pra lá de desonestos.
Toda greve é um instrumento político, então soa risível ler no editorial que a greve tem “um componente político”, pois é “incensada” pelo ANDES-SN, que seria um “enclave do PSOL, que disputa a hegemonia na esquerda”. Para o jornal fluminense, um dos principais problemas da greve é a proposta de revogação do Novo Ensino Médio (NEM), haja vista que a paralisação é “organizada por sindicatos mais preocupados em fazer política do que melhorar a qualidade do ensino”.
Nunca é demais lembrar que o NEM, apoiado pela Globo e entidades empresariais que veem a educação como um grande negócio, é repudiado por docentes e estudantes que experimentaram a tragédia de verem disciplinas essenciais serem substituídas por componentes que ensinam a fazer brigadeiro caseiro ou outros absurdos.
Como fizeram em 1964, quando apoiaram o golpe; como seguiram fazendo ao longo da Ditadura, que apoiaram entusiasticamente; como fizeram em 1989, quando conspiraram em favor de Collor, e depois repetiram na campanha pela derrubada de Dilma e prisão de Lula, alimentando o mostro da Lava Jato, que abriu as portas para o fascismo, a empresa da família Marinho não esconde sua natureza oportunista. Esperava-se que tivesse aprendido alguma coisa com o passado, mas se prova aqui que seriam capazes de fazer tudo novamente.
*Carlos Zacarias de Sena Júnior, graduado em História pela Universidade Católica do Salvador (1993), mestre em História pela Universidade Federal da Bahia (1998) e doutor também em História pela Universidade Federal de Pernambuco (2007), Professor do Departamento de História da UFBA.
Contato: [email protected]
Publicado no Jornal A Tarde, (Coluna do autor), edição de 10.05.2024.